CARTA ABERTA À REITORIA DA UFJF, GIRLENE ALVES DA SILVA, CONTRA A JORNADA DE 44H DOS JORNALISTAS TERCEIRIZADOS, QUE DESRESPEITA A PROFISSÃO E A LEI
Magnífica Reitora e Excelentíssimo Vice-Reitor,
Com o sentimento da mais viva indignação, a direção do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Juiz de Fora vem, por meio desta carta, manifestar sua profunda preocupação com a situação dos jornalistas terceirizados que atuam na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Atualmente, esses profissionais cumprem jornadas de 44 horas semanais, em evidente contrariedade à legislação que regulamenta a profissão e que prevê 30 horas semanais de trabalho para jornalistas, conforme o artigo 303 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O Decreto-Lei nº 972/1969, que dispõe sobre o exercício da profissão, reforça o mesmo limite, e a Portaria nº 97/2012, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, fixa inclusive 25 horas semanais para jornalistas que atuam em órgãos da administração pública direta e indireta.
A manutenção dessa carga horária excessiva, além de ilegal, representa uma grave forma de precarização da atividade jornalística dentro de uma instituição pública que, pela sua natureza e missão, deveria ser exemplo de respeito aos direitos trabalhistas e à valorização do conhecimento técnico e intelectual.
Não há democracia que sobreviva sustentada por precariedade — seja no jornalismo ou em qualquer outro setor. Não há democracia sem escrutínio dos poderes econômicos e políticos, sem informação verificada, rigorosa e diversificada que ajude a sociedade a tomar decisões informadas. O jornalismo responsável é um pilar essencial da vida democrática e do combate à desinformação.
Em um momento histórico em que celebramos 40 anos da redemocratização do país, o jornalismo enfrenta novas ameaças. Uma delas é justamente a normalização das condições precárias de trabalho, que empobrecem a profissão, afugentam talentos e colocam em risco a própria qualidade da informação que circula no espaço público.
Relatório da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) aponta que, apenas no último ano, foram registrados 144 casos de violência contra profissionais da imprensa — uma agressão a cada dois dias e meio. Mas a maior violência enfrentada pelos jornalistas brasileiros hoje é a precarização estrutural do trabalho, que se manifesta na sobrecarga, no adoecimento mental e físico, na violação de direitos e no empobrecimento da renda.
Estudos recentes apontam indicadores alarmantes de precarização social entre trabalhadores da comunicação: flexibilização da jornada e do salário, vínculos precários, multifuncionalidade forçada, infraestrutura insuficiente, intensidade de trabalho crescente, insegurança de vínculos e adoecimento. É esse o contexto no qual a UFJF — uma instituição que tem a democracia e o conhecimento como valores fundantes — mantém jornalistas terceirizados com jornada de 44 horas semanais.
Em seu discurso de posse, Vossa Magnificência afirmou que “a democracia nos é muito cara no ambiente da Universidade. Como valor universal que deve ser sempre caracterizado.” E, evocando Guimarães Rosa, citou: “Quem elegeu a busca não pode recusar a travessia.”
O Sindicato dos Jornalistas de Juiz de Fora acredita que parte dessa travessia, hoje, passa pelo reconhecimento concreto da importância da categoria dentro da Universidade — e pela adequação imediata da jornada de trabalho dos jornalistas terceirizados aos parâmetros legais e éticos da profissão.
Em 2009, travamos uma luta árdua, mas bonita, para preservar a exigência do diploma para o exercício do jornalismo. Estávamos juntos: estudantes, jornalistas, professores e reitoria. Fomos derrotados, mas com a consciência de que detestaríamos estar no lugar de quem nos venceu.
Isso porque a suposta vitória não se deu com base em princípios éticos ou constitucionais, mas se fundamentou em interesses empresariais voltados à contratação de mão de obra barata e não especializada. Esperamos que a Universidade Federal de Juiz de Fora, enquanto espaço de saber, não repita essa lógica, mas reafirme o valor do jornalismo profissional como instrumento de cidadania, transparência e democracia.
Pensar em substituir cargos jornalísticos por funções análogas pinçadas da Classificação Brasileira de Ocupações é demonstrar falta de compreensão sobre a natureza intelectual, técnica e social da atividade jornalística. O jornalismo não é intercambiável com funções “mais em conta”. É ele quem assegura a qualidade da comunicação pública, o rigor da informação e o direito da sociedade a ser informada de maneira ética e responsável.
Magnífica Reitora, seguindo o que nos ensina o poeta, jornalista e letrista piauiense Torquato Neto: “É preciso que haja alguma coisa alimentando o meu povo; uma vontade, uma certeza, uma qualquer esperança.” É assim, sedentos de uma qualquer esperança, que apresentamos o nosso apelo para que a UFJF reveja sua posição e adote medidas imediatas para reduzir a jornada dos jornalistas terceirizados, adequando-a à legislação e aos princípios que regem o serviço público e a atividade jornalística.
Defender condições dignas de trabalho é defender a democracia. E nenhuma universidade pública pode se omitir dessa travessia.
Juiz de Fora, novembro de 2025.
Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Juiz de Fora



